Fee e performance
ganham mais espaço nas formas de remuneração
O mercado brasileiro de agências de publicidade avançou para
além da tradicional comissão de mídia
por PAULO MACEDO
Pelo ranking de investimentos
brutos em mídia do Kantar Ibope, o mercado brasileiro contabilizou um
faturamento anual de R$ 132 bilhões no ano passado. Mas, as formas de
remuneração das agências estão cada vez mais diversificadas.
O fee passou a ser instrumento
recorrente. O executivo Luis Fernando Musa, CEO da Ogilvy Brasil, calcula que
90% das receitas tem origem nessa métrica e o restante vem de outras
combinações como o sucesso do fee. E esse mecanismo está de acordo com as normas
do Cenp (Conselho Executivo das Normas-Padrão).
David Laloum: “A adoção do fee ocorre em diferentes formatos”
David Laloum, presidente da
Y&R, a maior agência do país, esclarece que o fee é uma forma de
remuneração estabelecida por vários clientes, mas reconhece que o volume
proveniente de compra de mídia ainda é a maior fonte de receita no mercado
brasileiro. “A adoção do fee ocorre em diferentes formatos. Em alguns casos o
valor definido é, basicamente, um complemento de remuneração, acordado em cima
de escopos específicos. E, em casos mais raros, dependendo do produto ou
serviço, pode até ser a principal forma. A comissão sobre o valor da compra de
mídia é uma maneira confiável de dimensionarmos o escopo de trabalho”,
argumenta Laloum.
Na Y&R, o prêmio pela
performance já é regular no mix de receitas. Laloum explica: “O success fee é
um dos elementos de remuneração na Y&R há muito tempo. Temos atuado como
parceiros de negócio dos nossos clientes e, por isso, nos parece natural ter
uma parte da nossa remuneração atrelada aos resultados. Com a maior parte dos
nossos clientes temos um sistema de bônus que depende do desempenho da agência,
em cima de SLAs (Service Level Agreement), de dados qualitativos e
quantitativos de performance da marca, das campanhas e, eventualmente, de
vendas. Este pode representar de 10% a 15% da nossa remuneração em alguns
casos”.
Para Sergio Prandini, CEO da Grey
Brasil, observa transformação no jeito de geração de receitas das agências,
agora com fatores tangíveis e intangíveis. “Não é difícil precificar uma
demanda de trabalho específica envolvendo um determinado volume de entrega e,
consequentemente, de profissionais. No entanto, como precificar o intangível?
Como valorar uma ideia que pode transformar o negócio dos clientes? Hoje o
nosso escopo de trabalho está muito mais amplo e desafiador. Muitas vezes
criamos soluções que não passam pelas áreas de mídia, e estão mais relacionadas
a desenvolvimento de produtos. Neste caso, pode-se entender que o fee passa a ter
um papel fundamental na nossa base de remuneração. Com a Gafisa temos uma parte
variável da remuneração atrelada à performance de vendas dos empreendimentos. O
desafio, neste caso, é ter regras claras entre agência e cliente e,
principalmente, acesso às informações de vendas e atuação direta na avaliação
da estratégia de marketing do cliente”, ele afirma.
Na J.Walter Thompson, o CEO Ezra Geld informa que a maioria dos
clientes adota o sistema de fee
Na J.Walter Thompson, o CEO Ezra
Geld informa que a maioria dos clientes do portfólio de negócios da agência
adota o sistema de fee. “Temos alguns clientes que pagam por comissionamento de
mídia.
Mas isso deixou de ser modelo de precificação dos nossos serviços. E,
para os poucos clientes que ainda nos pagam dessa forma, passou a ser apenas um
mecanismo de pagamento”. Ele acrescenta: “Quase todos os nossos clientes têm um
elemento de remuneração variável. Uns usam métricas de marketing, outros de
vendas.
Mas a nossa posição é simples:
gostamos desse modelo, até porque é uma forma de mostrar o nosso
comprometimento com os negócios dos nossos clientes. A única coisa que exigimos
é que os critérios sejam claros, pois algumas métricas são qualitativas e
difíceis de mensurar. O negócio, afinal, tem de ser justo para todos os lados”.
Sócio e gestor da divisão
financeira da nova/sb, o executivo Antonio Calil Cury explica que o fee é
bem-vindo, mas que, no fim de um período, os valores precisam ser ajustados
compatível com a remuneração dos honorários de direito. “O fee pode ser adotado
e considerado uma antecipação da remuneração mensal à agência, tendo em vista a
indefinição de investimentos por parte do cliente e, como a agência
disponibilizará uma equipe “full time” ao cliente, nada mais justo que
remunerar essa equipe, permitindo à agência ter um fluxo de caixa para fazer
face a essa equipe, que estará à disposição do cliente, bem como não ficará na
dependência de apenas remunerar a agência quando houver investimento por parte
do cliente”, pondera Cury.
A Heads tem clientes que adotaram
o fee 100% e outros que combinam comissão de mídia e de produção. O sucess fee
também está na pauta. “Estimulamos este tipo de prática porque entendemos que
existem formatos simples, transparentes, e, principalmente, motivadores para
estabelecer o sucess fee. Atualmente temos acordos pautados por performance de
vendas, crescimento de participação de mercado e aumento do fluxo de clientes.
Somos remunerados pelos formatos tradicionais e usuais no mercado. O formato
pode variar para cada cliente, desde que estejam de acordo com as
normas-técnicas do Cenp”, destaca Gabriela Duarte, sócia e responsável pela
gestão da Heads.
Marcio Toscani, copresidente da
Leo Burnett Tailor Made, afirma que o fee não é o único componente de
remuneração da marca do Publicis Communications. “O repertório de serviços é
muito amplo. Tem o digital, o design, o conteúdo e outras infinitas possibilidades.
Com isso, as formas de remuneração podem ser fee, success fee, job a job,
remuneração por trabalho geral de horas (time sheet) e também comissão sobre
mídia e/ou produção. Hoje a complexidade é tamanha que em muitos casos demanda
vários modelos de remuneração para o mesmo cliente, dependendo da entrega
acordada”, diz.
Mesmo com tantos formatos de
remuneração, diferentes do desconto de 20% das agências, a comissão sobre
investimentos em mídia dos anunciantes, presente na Lei 4.680/65 e agora regido
pelas normas-padrão do Cenp e integrante da Lei 12.232, a lucratividade das
agências está em xeque. “O primeiro deles é naturalmente um fator conjuntural
macroeconômico no Brasil, no qual alguns dos nossos clientes estão desafiados e
pressionados pelo cenário econômico. Isso tem como consequência uma cautela
maior e para alguns uma redução dos investimentos em marketing. O segundo fator
está ligado à complexidade cada vez maior de operação das agências espelhando a
evolução da mídia no Brasil e no mundo, cada vez mais pulverizada e segmentada.
Isso gera um trabalho cada vez maior, e temos o desafio de sensibilizar os
clientes sobre a necessidade de remunerar essas novas disciplinas”, observa
Laloum.
Cury chama a atenção para a
inadimplência. “Se um anunciante, por qualquer problema, estratégia de mercado
ou impedimento legal, postergue ou até não invista em um determinado período, a
agência continuará com uma equipe à disposição dele; portanto, não havendo
investimento do cliente, a agência, caso não exista um fee mínimo mensal que
lhe permita remunerar a equipe que esteja à disposição do cliente, terá um
desembolso ou desencaixe que vai reduzir substancialmente seu fluxo e sua saúde
financeira. Por outro lado, considerando que a totalidade das despesas,
impostos e encargos sociais de uma agência são custeados pela mesma antes de receber
os seus honorários, qualquer atraso do cliente, no pagamento à agência, acaba
onerando-a ainda mais”.
Que fatores comprometem a
lucratividade e a saúde financeira das agências? Toscani responde. “O mesmo que
afeta a saúde de qualquer empresa, independentemente do ramo de atuação: quando
a conta não fecha. Comunicação é algo estratégico, que não deve ser tratado
apenas na ponta do lápis. Principalmente quando se está na área de prestação de
serviços, comprometimento, modernidade, engajamento e profissionais sêniores
têm um preço. A melhor estratégia é a transparência com o cliente, demonstrando
a composição dos custos da agência e as fontes de receita para que a agência
consiga equacionar a relação receita x custo e, no fim do dia, apresentar uma margem
de lucro, como toda empresa”.