domingo, 22 de fevereiro de 2015

Além do Digital

Beyond Digital

Por Nicholas Negroponte
com tradução livre de Sérgio Duarte

Às vezes, definindo o espírito de uma época pode ser tão simples como uma única palavra.

Você pode se lembrar, por exemplo, dependo da sua idade, o aconselhamento de carreira dada ao jovem Benjamin Braddock, interpretado por Dustin Hoffman, em The Graduate (no Brasil com o título a Primeira Noite de um Homem) filme de 1968:

- "Plásticos";
- "Exatamente como você quer dizer?" perguntou Ben.
- "Há um grande futuro em plásticos", respondeu o Sr. McGuire.

Mas, já hoje estamos nesse futuro, é claro, os plásticos não são grande coisa...

E pensar no digital seria a mesma banalidade nos dias atuais?
Certamente.

A tecnologia literalmente falando, já é uma coisa natural, e a conotação no futuro tende a ser comercial e um composto cultural de novas ideias.

Como o ar e a água potável, o digital vai ser notado apenas na ausência, que na presença.

As próximas décadas serão um período de compreensão da biotecnologia, dos computadores de DNA, microrobots, e nanotecnologias os principais personagens no palco tecnológico. Sem esquecermos as viagens extraterrestres...

Os computadores, como conhecido hoje, serão: chatos... Pois, eles irão varrer as partes visíveis em nosso dia a dia.

Viveremos em função das máquinas, até vamos vesti-las se for o caso, e até mesmo comê-las.

Um computador por dia vai manter a pessoa longe do (consultório) médico.

A escalada para o futuro

A Revolução Digital acontece agora, neste instante.

Como assim?

A Banda Larga já extrapolou...  Temos velocidade do processador, dimensões de rede, ou o tamanho miniaturização de dispositivos eletromecânicos, com exemplos.

Pela Lei de Moore, primeira exposta por Gordon Moore em 1965, é de fato um golpe de mestre. Note o acesso ao Terabit, processadores petahertz, redes planetárias, e unidades de disco sobre as cabeças dos pinos... Tudo já é maçante... (nota: Moore previu o período de 18 meses para os avanços em processadores com o mesmo custo para os usuários).

Sim, estamos vivendo agora em uma era digital, em qualquer grau a nossa cultura, infraestrutura e economia (nessa ordem).
Indiscutivelmente, há mudanças realmente surpreendentes no nosso estilo de vida e como administramos a nós mesmos coletivamente neste planeta.

Considere o termo "carruagem sem cavalos". Cegos por exemplo, os inventores do automóvel não podiam ver a enorme mudança que promoveriam sobre a forma de trabalhar, como podemos construir e viver em cidades na época deles...

Temos uma cegueira semelhante hoje. Tudo porque não podemos imaginar um mundo em que o nosso sentido de identidade e comunidade verdadeiramente conviva com a vida real e a virtual.  

Ser global
Como seres humanos, temos a tendência a desconfiar daqueles que não se parecem conosco, vestido como nós, ou agir como nós, porque o nosso campo imediato de visão inclui as pessoas mais ou menos como nós.

No futuro, as comunidades formadas por ideias serão tão fortes quanto as formadas pelas proximidades física. Consequentemente, as crianças não vão saber o significado do nacionalismo.

Os países, como conhecidos, hoje, irão se corroer, porque eles não serão grandes o suficiente para serem globais, e nem o pequeno o suficiente para serem locais.

A vida evolutiva do estado-nação vai passar a ser mais curta do que a de um dinossauro.

Ser grande e pequeno
Com todas as coisas digitais, ficamos grandes e pequenos ao mesmo tempo. Veremos um aumento em grandes corporações, aviões, hotéis e cadeias de jornais, em paralelo com o crescimento em empresas mom-and-pop (aquelas administradas por familiares, do tipo mamãe e papai...).

Ser nobre em função do tempo
O tempo será fundamental, pois vamos viver uma vida muito em ajustes com a falta de tempo... Qualquer loja que não estiver aberta 24 horas não será competitiva.

Continuaremos na pressa de chegar a nossa casa, nas grandes cidades, por volta das 9 da noite para assistir um programa de TV por causa do fator tempo (horário).
E há no horizonte, um renascimento completo de vida rural, fora das cidades... Nobre...

Ser igual
Infância e velhice serão redefinidas em suas formas na sociedade.

As crianças vão se tornar protagonistas em fazer e aprender em termos de aprendizagem.

Aposentadoria desaparecerá como um conceito, e uma vida produtiva será aumentada em todas as medidas...


Estar sem fronteiras.
A soberania é sobre a terra. Mas, hoje, uma cultura digital une as pessoas mais fortemente do que os adesivos territoriais da Geografia. Pergunte as pessoas sobre os fundamentos da água, ar e fogo.  

Fonte: http://web.media.mit.edu/~nicholas/Wired/WIRED6-12.html

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Efeitos da desmassificação

Efeitos da desmassificação

Adaptado por Sérgio Duarte de Jeferson Assumção

Em 2020, o mundo deverá ter mais de 24 bilhões de dispositivos conectados em rede, como apontam pesquisas da empresa Machina Research. >http://www.machinaresearch.com<

Com isso, haverá uma média de três aparelhos conectados por pessoa, incluindo celulares, eletrodomésticos, tablets e até computadores...]

Eles poderão ser utilizados heteronomamente. Ou de modo um pouco mais autônomo. Se de maneira heterônima, continuarão gerando massificação, mesmo que venha a ser um tipo customizado de massificação.

Os atuais avanços da era digital podem, se bem aproveitados, gerar um ambiente menos favorável à homogeneização cultural e à vigência do comportamento do que Ortega chamou de homem-massa - este produto da técnica da era industrial que se desenvolveu na virada do século XIX para o século XX.

Agora, em pleno século XXI, mais uma vez o desenvolvimento técnico vem trazer questões importantes para se pensar sobre como o ser humano se comporta em relação à tecnologia que ele mesmo desenvolve.

Diferentemente do homem-massa delineado por Ortega na década de 30 do século XX, os seres humanos atuais, do ponto de vista tecnológico, têm abundantes condições de viver numa multidimensionalidade da cultura.

Há mais acesso à diversidade cultural e às condições de se fazer as recombinações de elementos, processos e visões de mundo, muito mais do que em qualquer outro momento da humanidade.

Portanto, em se tratando de cultura, essa palavra cujo sentido em muito tem a ver com modos de fazer, de técnicas e interação de indivíduos entre si e destes com a natureza, uma cultura ligada ao ambiente digital não pode ser desconsiderada numa leitura mais plena de nosso tempo.

A cultura digital e seus rebatimentos estéticos (diversidade cultural e recombinações), éticos (ética do compartilhamento) e políticos (ação cidadã em rede, descentralizada e com menos mediação de estruturas verticais) são, em termos mais amplos, um importante tema.

Agora, com as novas condições, não há também mais desculpas: o homem-massa, paciente e agente de sua condição de massa, invertebrado habitante do ambiente técnico-consumista do século XX, dominado pelo mercado, por partidos, sindicatos e estados ortopédicos, de cima para baixo, não tem mais a quem jogar a responsabilidade. Ele pode recuperar sua autenticidade, como em nenhum outro momento da Humanidade.

A técnica do século XIX engendrava o homem-massa, dizia Ortega. A técnica do século XXI pode engendrar o pós-homem-massa. Se para os frankfurtianos e para a teoria crítica, o comportamento heterônomo era inculcado pela indústria cultural nas cabeças das pessoas, hoje este elemento se fragmenta. Desaparecem dia a dia os mediadores e as indústrias de fabricação de suportes materiais da arte e, de todo lado, movimentos de indivíduos em rede trazem as visões da periferia para o centro do debate sobre cultura.

Com tudo isso, é possível dizer que estão dadas as condições técnicas para a superação tanto do homem massificado quanto do homem atomizado, fechado em si, solipsista, consumista individualizado e não participante de sua circunstância?


Fonte: texto de Jéferson Assumção, do livro 
"Homem-massa: a filosofia de Ortega y Gasset e sua crítica à cultura massificada".